Sapatos voavam do céu numa tentativa de aniquilação dos apegos angelicais. Ano após ano o ritual se repetia para as candidatas a anja.
No céu:
- Como pensam andar sobre as nuvens com saltos altos? Não percebem que farão rombos nos preciosos tapetes algodoados?
Tristes e infelizes as candidatas eram forçadas a desfazerem-se de todos os seus sapatos, afinal, anjos não usam sapatos e ainda por cima voam.
Na terra:
Maria corria pelo terreno baldio atrás do filho Marcelo que todos os dias fugia bem na hora de ir para a escola. No meio do campinho Maria observa um amontoado e com seu sotaque nordestino brada:
- Era só o que me faltava agora transformarem o campinho em lixão. Será possível?
Marcelo surge do meio do monte e grita:
- ói, mãe, desta vez eu cheguei bem na hora da chuva de sapatos. Não é que dei sorte "memo"?
Perplexa Maria ajoelha e pede aos céus pra ficar com um par daqueles ali. Um par não faria diferença. Promete uma vela e uma cruz pra Santa dos pés (des)calços. Leva consigo uma anabela vermelha com detalhes brancos pra usar no baile de sábado e de quebra, prometendo uma outra vela, leva um sapato salto agulha pra quando for madrinha de casamento.
No céu:
Benê chora a perda dos sapatos alegando que isto não estava no contrato que assinou quando se candidatou à vaga de anja. Tampouco quer que suas asas cresçam e peleiteia asas de silicone que podem ser removidas na hora de dormir.
Na terra:
Maria acendou 7 velas e para cada vela se deu o direito e pegar um par de sapatos. Acendeu uma vela de 7 dias e pegou mais 7 pares de sapato. Prometeu rezar uma novena e com esta feita colocou na sacola os últimos 9 pares que escolheu.
Sentia-se vanGLORIAda. Olhou pro céu e viu um rosto. Coçou os olhos e voltou a olhar pra cima. Sim, havia um rosto entre as núvens....estaria vendo coisas?
No céu:
Benê rompeu a regra máxima: enfiou a cara na núvem e fez-se ver pelos humanos. Algo estritamente probido às candidatas de anja.
Na terra:
Maria encarou a face entre as núvens
No céu:
Benê envia um vento com mensagem sonora: foi daqui que cairam todos estes sapatos
Na terra:
Maria se encanta com a notícia e pergunta se pode dar uma espiadinha na loja
No céu:
Maria sente-se lisonjeada pisando com os pés descalços em tapete tão algodoado
Na terra:
Benê não sabe o que fará com tantos sapatos num lugar tão pobre
Não havia mais o que fazer a troca de lugar era irreversível
quinta-feira, 2 de agosto de 2012
Sua cabeça girava produzindo pensamentos coloridos. Um fênomeno próprio dos dias de muita inquietação.
O arcoíris produzido expandia-se alcançado uma distância nunca antes vista.
À medida que seus pensamentos reluziam, seu corpo diminuia de tamanho até que pode transitar no universo dos insetos. Não fossem as cores que o envolviam passaria completamente desapercebido do mundo humano.
Sentia-se a pulga atrás da orelha e pela primeira vez entendeu a expressão mas ainda não sabe como explicá-la. Seriam coisas de inseto ou de humano reduzido ao quase nada? Também não sabe dizer.
Perambulou na sua nova forma por alguns meses humanos sem se dar conta que sua luz diminuia. Até que esta se apagou e num piscar de olhos estava de volta à sua mesa de trabalho usando as mesmas lentes para miopia de antes.
Levantou-se e caminhou até a janela. Saltou e não morreu. Impressionado ficou em saber que havia sobrevivido à tentativa de suicídio.
Foi amparado pela família que o acolheu sem qualquer restrição. O amavam.
O homem dos pensamentos coloridos manteve sua vida humana regulada pelo tempo dos insetos. Assumiu a miopia e calou-se para que seus dedos produzissem falas.
E esta é uma delas.
Paula Tura
O arcoíris produzido expandia-se alcançado uma distância nunca antes vista.
À medida que seus pensamentos reluziam, seu corpo diminuia de tamanho até que pode transitar no universo dos insetos. Não fossem as cores que o envolviam passaria completamente desapercebido do mundo humano.
Sentia-se a pulga atrás da orelha e pela primeira vez entendeu a expressão mas ainda não sabe como explicá-la. Seriam coisas de inseto ou de humano reduzido ao quase nada? Também não sabe dizer.
Perambulou na sua nova forma por alguns meses humanos sem se dar conta que sua luz diminuia. Até que esta se apagou e num piscar de olhos estava de volta à sua mesa de trabalho usando as mesmas lentes para miopia de antes.
Levantou-se e caminhou até a janela. Saltou e não morreu. Impressionado ficou em saber que havia sobrevivido à tentativa de suicídio.
Foi amparado pela família que o acolheu sem qualquer restrição. O amavam.
O homem dos pensamentos coloridos manteve sua vida humana regulada pelo tempo dos insetos. Assumiu a miopia e calou-se para que seus dedos produzissem falas.
E esta é uma delas.
Paula Tura
Olim-piadas
Antes fossem piadas engraçadas. Mas é sério e chega a ser triste.
Vibro com os atletas. Torço pela nação. Admiro a dedicação. Tudo em vão.
Os resultados dos jogos, que vez ou outra podem surpreender, são em sua maioria previsíveis.
Os países que tem as melhores estruturas se darão melhor, obviamente.
Atletas por vezes deixam seus países de origem para treinar, por longos anos, em países onde os centros de treinamento são mais adequados. Na competição defendem as cores de sua bandeira nacional.
Fico frustrada, entusiasmada e ao mesmo tempo perplexa. São tantos acontecimentos em uma fração de segundo. Choro, me desespero e penso: são reflexos da sociedade e apenas isto.
A economia forte trás a medalha de ouro. A economia fraca não trás medalha. Simples e cruel assim mesmo.
O povo assiste ao espetáculo esperando que surja um novo heroi. Se frustra também.
Já cansei há muito do Neymar. Pelo que me consta um time contem 11 jogadores. Para o Brasil só existe um em campo: Neymar. É a bola da vez como já foram tantos outros. Fico enjoada por sabe que seu destino será engordar, cair na difamação da mídia e se vangloriar do passado. Como se o futuro nunca pudesse ser planjeado e o presente foi vivido conforme aquilo que a Nike indicou.
Admiro a força de vontade dos participantes das Olimpíadas, sua garra, sua determinação para ser corpo máquina. Sua vontade de vencer ainda que lesionados e lutando contra a idade que (sempre) chega. Admiro a emoção, a sensibilidade, a crença de que foram feitos para vencer acima de qualquer coisa. A persistência frente a derrota e treino após treino como um robô até a exaustão.
Acho lindo o ginasta olímpico. O invejo eu diria. Por outro lado penso como eu odiraria as barras, o cavalo, o solo, a argola, a trave se tivesse que ficar o dia inteiro trancada na mesma sala que eles, dependendo deles, trepada neles. A repetição do movimento me levaria à contemplação?
Fico incomodada com meu corpo moldado ao sofá assistindo a corpos rijos, definidos, "saudáveis", galopantes e vibrantes. Passivamente me corpo vibra com a ação do outro. Enquanto vejo o movimento alheio tolho meu corpo de movimentar-se. Concluo que há algo errado e saio pra caminhar.
Olim-piadas estão a chegar aqui nas bandas latinas. Como será que ser portarão nossos corpos? Teremos dinheiro para assistir aos jogos? Em Londres não se teve e de última hora implantou-se um público de professores e alunos levados gratuitamente aos estádios. Somos pobres aqui abaixo do equador. Estamos habituados aos corpos soltos nas praias. Ficariamos calados assistindo aos jogos de tênis? Caberiam todos os visitantes na baixada fluminense?
Acompanharei, pensarei e escreverei com notícias da terra do sol de 40 graus.
Paula Tura
Vibro com os atletas. Torço pela nação. Admiro a dedicação. Tudo em vão.
Os resultados dos jogos, que vez ou outra podem surpreender, são em sua maioria previsíveis.
Os países que tem as melhores estruturas se darão melhor, obviamente.
Atletas por vezes deixam seus países de origem para treinar, por longos anos, em países onde os centros de treinamento são mais adequados. Na competição defendem as cores de sua bandeira nacional.
Fico frustrada, entusiasmada e ao mesmo tempo perplexa. São tantos acontecimentos em uma fração de segundo. Choro, me desespero e penso: são reflexos da sociedade e apenas isto.
A economia forte trás a medalha de ouro. A economia fraca não trás medalha. Simples e cruel assim mesmo.
O povo assiste ao espetáculo esperando que surja um novo heroi. Se frustra também.
Já cansei há muito do Neymar. Pelo que me consta um time contem 11 jogadores. Para o Brasil só existe um em campo: Neymar. É a bola da vez como já foram tantos outros. Fico enjoada por sabe que seu destino será engordar, cair na difamação da mídia e se vangloriar do passado. Como se o futuro nunca pudesse ser planjeado e o presente foi vivido conforme aquilo que a Nike indicou.
Admiro a força de vontade dos participantes das Olimpíadas, sua garra, sua determinação para ser corpo máquina. Sua vontade de vencer ainda que lesionados e lutando contra a idade que (sempre) chega. Admiro a emoção, a sensibilidade, a crença de que foram feitos para vencer acima de qualquer coisa. A persistência frente a derrota e treino após treino como um robô até a exaustão.
Acho lindo o ginasta olímpico. O invejo eu diria. Por outro lado penso como eu odiraria as barras, o cavalo, o solo, a argola, a trave se tivesse que ficar o dia inteiro trancada na mesma sala que eles, dependendo deles, trepada neles. A repetição do movimento me levaria à contemplação?
Fico incomodada com meu corpo moldado ao sofá assistindo a corpos rijos, definidos, "saudáveis", galopantes e vibrantes. Passivamente me corpo vibra com a ação do outro. Enquanto vejo o movimento alheio tolho meu corpo de movimentar-se. Concluo que há algo errado e saio pra caminhar.
Olim-piadas estão a chegar aqui nas bandas latinas. Como será que ser portarão nossos corpos? Teremos dinheiro para assistir aos jogos? Em Londres não se teve e de última hora implantou-se um público de professores e alunos levados gratuitamente aos estádios. Somos pobres aqui abaixo do equador. Estamos habituados aos corpos soltos nas praias. Ficariamos calados assistindo aos jogos de tênis? Caberiam todos os visitantes na baixada fluminense?
Acompanharei, pensarei e escreverei com notícias da terra do sol de 40 graus.
Paula Tura
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