quarta-feira, 27 de abril de 2011

Seu papagaio voava alto

Mas o dela voava ainda mais alto

Deu linha para alcançá-la

Por instantes voaram lado a lado por entre as nuvens

Comportada ela recuou. Já havia lhe dado linha demais.
Sonhava com plumas, paetês e glamour

Em seus sonhos flutuava nas passarelas desfilando vestidos elegantes em porte de princesa

Emocionava-se ao tocar os sapatos prateados

E sobressaltava-se cada vez que o metrô chegava na Estação Sé

Será que nunca chegaria a calçar os sapatos?
Um ponto
Dois pontos
Três pontos

Pronto, já tenho uma constelação!
Era a milésima vez que tentava escrever uma história inédia. Daquelas que surpreendem.

Não conseguia encontrar uma forma de começar. Inverteu a ordem trazendo o final para início.

Quando percebeu, a história estava sem pé nem cabeça.
Pior de tudo, estava sem o tronco e os membros também.

Hoje é milionário: escreve histórias de terror.
Dona Sinhá contô
Que sabiá já cantô
Foi canto tão cantadô
Que Seu João soluçô

Eu daqui fico a imaginá
Que será destas bandas de lá
Donde canta o sabiá
Sem precisá se esforçá

Das bandas daqui
Tem buzina, moto e muito baruio
Tem grito de muleque, de mascate e prosadô
Tem sol que nasce até sem galo que cantô
Que falta de pudor

Queria que sabiá cantasse nas banas de cá
Queria o bolo de fubá, a canjica e o curau
E Dona Sinhá botando lenha no fugão
Que bom seria o canto da roça no alvoroço do dia

domingo, 24 de abril de 2011

E o coelhinho da Páscoa chegou.
Matreiro, alvo e saltitante.
Olhou, perambulou, fuçou.
Nenhum ovo encontrou.
Fora esquecido?
Chorou.
Emagreceu, empalideceu, murchou.
Nunca mais saltitou.
Fez promessa para passar a dor.
O mundo amargo ficou.

quarta-feira, 13 de abril de 2011

Noite de outono com lua crescente
Brisa refrescante, dia morno, gente feliz
As folhas caem, as águas correm, os pássaros cantam
Seria idílico se não fosse real
Talharam minha língua e eu chorei.

Cortaram minha garganta e eu sangrei.

Ataram minhas mãos e eu parei.

Proibiram-me de pensar e eu morri.

domingo, 10 de abril de 2011

Se sentia aliviada com a ausência dele.

Era uma ausência temporária. Por isto não a temia. Sabia que em breve ele retornaria.

Os tempos mudaram. Hoje, o que era alívio tornou-se aflição. Sua ausência é eterna e o vazio infinito.

Não há substitutos. Não há preenchimento. Há apenas o momento presente.
Vivemos carregando balões de indagações. Iguais àqueles coloridos que as crianças tanto gostam. Já as respostas, onde será que estão?
A cada manhã Maria tecia seu dia.

Preparava o café, assava o pão, mandava as crianças para a escola.

Planejava os momentos de descanso, os alinhavos das roupas, a conversa com as vizinhas, as compras.

Certa vez não houve manhã. Os pássaros não cantaram e o dia não nasceu.

Ficou escuro. Uma semana de escuridão e o dia clareou. O povoado estranhou.

Chegou a noite e a lua não mudou. Era a mesma da semana anterior. Desta vez o relógio parou, a lua não mais se moveu e a maré secou.

Maria rezou. Não sabia se pedia para escuridão voltar ou para a lua mudar. Rezou em desespero palavras desconexas. Chorou e não mais falou. Não por falta de vontade mas por ausência das vogais que não encontravam as consoantes e desta forma não havia palavras.

O povoado emudeceu. Maria retirou-se de casa e caminhou. Quando não mais sabia para onde ir começou a girar ao redor de si num ato de loucura e agonia. Girou, girou, girou e aumentou a velocidade. Girava com os braços abertos a cabeça tombada para o lado, o corpo preenchendo o espaço entre o céu e a terra. Girava como uma vez já girou o mundo.

E Maria acordou. Levantou-se, preparou o café, assou o pão, mandou os meninos pra escola. Sentou-se na cozinha, pegou lápis e papel e teceu o seu dia.
Foi-se a vez em que era fácil viver. Nasço e renasço a cada dia sem saber pra onde ir.

Havia um texto organizado em minha mente a ser despejado aqui. Já não lembro seu título e tampouco seu conteúdo. Amnésia precoce ou o meu inconsciente decidiu poupar a humanidade?

Pesados fardos eu sinto ao nascer do dia. As horas não passam. Os passos dos vizinhos são previsíveis. Os pensamentos giram em círculos como crianças brincando de ciranda. Coma consciente.

Urano está em áries hoje. Vamos correr?

A chuva cai e lava os céus despejando sobre nós as lágrimas dos anjos em prece. Amém!
Óh chuva que lava minh´alma!